Fim do mundo
em 2012 - por www.istoe.com.br
Ao misturar
arqueologia, ciência e religião, teorias apocalípticas ganham popularidade e
fazem crescer o número de pessoas que se preparam para o juízo final Paula
Rocha, Flávio Costa e João Loes.
Aos 71 anos,
o relojoeiro aposentado Tikao Tanaka passa seus dias contando as horas que lhe
restam até o mundo acabar. O senhor de gestos contidos e sorriso tímido,
natural da cidade de Guararapes, no interior de São Paulo, diz estar se
preparando para o fim dos tempos, marcado para o dia 21 de dezembro de 2012.
Junto de sua família, Tanaka comprou uma propriedade de 20 mil metros quadrados
no município de Alto Paraíso de Goiás, na Chapada dos Veadeiros, um dos poucos
lugares, que, segundo ele, serão preservados após um tsunami devastar a costa
brasileira no dia fatídico. “Quando a hora chegar, vou me mudar para lá de
vez”, diz. Acreditando na mesma teoria apocalíptica, a irmã e o cunhado do
relojoeiro já estão na cidade goiana há pelo menos três meses.
CRENÇA
Jairo Pontes, de Alphaville (com a mulher, Maria Isabel,
e os filhos), acredita no juízo final entre 2028 e 2036
Jairo Pontes, de Alphaville (com a mulher, Maria Isabel,
e os filhos), acredita no juízo final entre 2028 e 2036
A exemplo
dos discípulos do professor Hirota, muita gente acredita que o mundo pode
acabar em 2012. Ou pelo menos que catástrofes e tragédias de proporções nunca
antes vistas estão marcadas para ocorrer no próximo ano, mais especificamente
no dia 21 de dezembro. A data, que assinala o fim do calendário solar dos maias
– uma das mais importantes civilizações pré-colombianas –, levantou toda sorte
de teorias apocalípticas e desencadeou um fenômeno cuja magnitude se compara
aos desastres previstos. Segundo um relatório da “Missão Interministerial de
Luta contra Seitas” (Miviludes), da França, foram registrados mais de 2,5
milhões de sites que propagam profecias sobre 2012. Já existe até uma rede
social exclusiva para aqueles que acreditam nas teorias fatalistas e desejam se
preparar para o dia final. Chamado “2012 Connect”, o portal conta com mais de
1,5 mil membros. O site da Nasa (Agência Espacial Americana) recebeu nos
últimos três anos milhares de mensagens de pessoas desesperadas para saber se
há possibilidade de o mundo acabar em breve. Seitas que aguardam o fim dos dias
se proliferam em vários cantos do planeta e até o governo do México, região
onde viveram os maias, quer tirar proveito da febre do fim do mundo. As cidades
que conservam as ruínas da antiga civilização devem receber 52 milhões de
turistas em 2012, 30 milhões a mais do que o habitual.
Aqui no
Brasil, em Alto Paraíso, o município que, segundo Hirota, deverá sair ileso das
catástrofes, os efeitos da especulação imobiliária causada pelo apocalipse já
podem ser sentidos. Pelo menos duas dezenas de seguidores do autointitulado
guru – a maioria descendentes de japoneses – já compraram casas e terrenos na
cidade de nome celestial, também conhecida como a “Capital Brasileira do
Terceiro Milênio”, dada a quantidade de adeptos dos mais diversos esoterismos
que acorrem para lá. “E há mais 47 interessados em comprar imóveis aqui por
causa do fim do mundo”, diz Milton Silva, gerente da imobiliária Kalunga
Imóveis, que atua na região. “Esperamos que ocorra em 2012 o mesmo boom de
turistas que vieram para cá na virada de 1999 para 2000”, diz Fernando Couto,
secretário de Turismo de Alto Paraíso. “Sei que já há quartos alugados em
pousadas para o dia 21 de dezembro, mas até essa data veremos o número de
visitantes aumentar.”
Mais ao Sul
do País, na cidade de Porto Belo, em Santa Catarina, a migração de turistas é
motivada por uma seita chamada “Movimento Salvai Almas”, fundada em 1997 pelo
aposentado Cláudio Heckert, 66 anos. Católico e pai de sete filhos, Heckert diz
receber mensagens de Nossa Senhora constantemente, entre elas um alerta de que
o mundo passará por uma terceira guerra mundial em maio de 2012. “Três bombas
nucleares serão detonadas”, diz Arnaldo Haas, porta-voz do grupo, que garante
ter respaldo bíblico para todas as previsões que chegam de Maria, mãe de Jesus,
através de Heckert. Segundo o suposto profeta, quem sobreviver à hecatombe
atômica terá ainda de escapar da queda de uma estrela, em setembro, e do juízo
final, marcado para 25 de dezembro do mesmo ano. “Será rápido e fulminante, mas
os filhos de Deus não têm o que temer”, diz Haas. Confiantes, os membros do
movimento nem irão se preparar para a tragédia. “Quando a hora chegar”, diz
Haas, “Deus garantirá proteção e multiplicará, apenas para os fiéis, provisões
como alimentos e água.”
Contar com o
auxílio divino no momento final, no entanto, não tem sido o suficiente para
todos que esperam terremotos, tsunamis e outras calamidades em 2012. O
americano Dennis McClung, morador da cidade de Phoenix, no Arizona, ganhou fama
por transformar a casa em que vive com a mulher, Danielle, e os filhos, Caden,
4 anos, e Vedah, 2, num verdadeiro refúgio antiapocalipse. Desde 2009 a família
se prepara para uma possível explosão solar em 2012, que comprometeria o
funcionamento de serviços básicos como luz, água e comunicações aqui na Terra.
“Se os Estados Unidos saírem do ar por causa de uma explosão solar, todos terão
apenas alguns dias de água, pouca comida e em uma semana viveremos no caos”,
diz McClung. Para aumentar suas chances de sobrevivência, o webdesigner
desenvolveu uma estrutura autossuficiente no fundo do quintal, que inclui a
criação de tilápias, galinhas e cabras e o cultivo de vegetais e folhas. Caso
tenha que fugir de casa, comprou máscaras e roupas à prova de substâncias
tóxicas e radioativas. O americano Peter Larson também construiu um bunker a
uma hora de sua casa, em Salt Lake City, no Utah, para os 12 membros da sua
família. A porta suporta até 36 toneladas de pressão e há comida para dois
anos. O medo de Larson é que o mundo acabe num ataque nuclear. “As chances de
um holocausto estão maiores com o ingresso do Irã e da Coreia do Norte no clube
de países nucleares”, diz.
Se as novas
tecnologias que possibilitam maior proteção contra as possíveis tragédias
propagadas para 2012 são modernas, o fim do mundo não tem nada de novo. Há
milênios, profetas das mais diferentes crenças e religiões vêm a público para
defender datas que marcariam o apocalipse. Felizmente (e obviamente) todos
falharam até aqui. O americano Harold Camping, um dos arautos do fim dos tempos
mais fracassados do mundo, já previu e errou o dia do juízo final três vezes.
Isso não o impediu, porém, de conquistar seguidores até no Brasil. No bairro de
Nova Gameleira, em Belo Horizonte, fica a sede nacional da Family Radio,
organização criada por Camping. Em maio de 2011, o líder brasileiro do grupo,
Harold Gulli – que mora nos Estados Unidos – veio ao País para divulgar o fim
do mundo entre os brasileiros. Com um pequeno bando de seguidores, distribuiu
panfletos em São Paulo, São Bernardo do Campo e São José dos Campos, pedindo às
pessoas que se arrependessem de seus pecados. Mas o fim dos dias, marcado por
Camping para 21 de maio, não aconteceu.
A data do
fim do mundo da vez, 21 de dezembro de 2012, se tornou popular após
interpretações de escritos maias encontrados no templo de Palenque, no sul do
México. Ali está registrado que um dos calendários maias, a roda calendária,
terminaria neste dia. O marco teria sido calculado através da observação
astronômica e da análise de outros dois calendários maias, o Zolkin, que
pautava a vida religiosa, e o Haab, ligado às guerras e à vida civil. “Mas os
maias não deixaram nenhum registro de que o mundo acabaria”, diz Alexandre
Navarro, doutor em arqueologia pela Unam (Universidad Nacional Autónoma de
México) e professor de história da América da Universidade Federal do Maranhão
(UFMA). “O fim da roda calendária representa apenas o término de um ciclo”,
diz.
BUNKER
Dennis McClung, de Phoenix (EUA), estoca água,
mantimentos e utensílios à espera do apocalipse
Dennis McClung, de Phoenix (EUA), estoca água,
mantimentos e utensílios à espera do apocalipse
Mas, para
alguns fiéis do fim dos tempos, outros sinais indicariam que o reino dos homens
sobre a Terra estaria prestes a acabar. Misturando arqueologia e ciência,
profecias correm a internet afirmando que em 21 de dezembro de 2012 um raro
alinhamento do Sol com os planetas do sistema solar poderia interferir na
gravidade da Terra, causando maremotos, terremotos e muitas mortes. “Esse
alinhamento, de fato, acontecerá, mas não significará absolutamente nada”, diz
o astrônomo Carlos Henrique Veiga, coordenador da Divisão de Assuntos
Educacionais do Observatório Nacional. Segundo o especialista, o fenômeno já
ocorreu milhares de vezes desde que nosso planeta existe e nunca gerou
consequências perceptíveis. “Cataclismas, tsunamis e terremotos não são
ocasionados pela atração gravitacional dos planetas”, reforça.
Mesmo que o
mundo não acabe em 2012, ainda assim muitas pessoas não descartam a hipótese do
fim numa data futura. Para o empresário paulista Jairo Pontes, várias
catástrofes naturais devem ocorrer em 2012, mas não serão suficientes para dar
cabo à vida no planeta. “O juízo final está marcado entre 2028 e 2036”, diz.
Nesse período, de acordo com o seguidor da Igreja Cristã Apostólica Profética
de Alphaville, um meteoro deverá atingir a Terra e três quartos da população
mundial perecerá instantaneamente. “Só quem acreditar em Jesus e for batizado
será salvo”, afirma Pontes. Saindo da seara religiosa, a fotógrafa Lívia
Buchele, 32 anos, também acredita no apocalipse, mas sob o viés ambiental. “O
fim do mundo já começou”, diz Lívia. “Se não mudarmos nosso estilo de vida, o
planeta chegará ao seu limite e será o nosso fim.”
Seja por
motivos religiosos, seja por motivos científicos ou ecológicos, o apocalipse
sempre despertará o interesse e a curiosidade do homem, independentemente das
crenças de cada um. “Pensar no fim do mundo nos desperta um sentimento de
ambiguidade”, explica Teresa Creusa Negreiros, doutora em psicologia clínica e
professora da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ). “Ao
mesmo tempo que tememos um fim coletivo, também o desejamos, pois assim não
deixaríamos a vida sozinhos.” Se o dia 21 de dezembro de 2012 terminar como
todos os outros, isso não significará, contudo, o fim das profecias sobre o fim
do mundo. Será só mais uma possibilidade de lembrar a célebre frase de Santo
Agostinho, no livro “A Cidade de Deus”: qualquer previsão que fale em uma data
não passa de uma fábula ridícula.
PARANOIA
Peter Larson, de Salt Lake City (EUA), em seu bunker
para 12 pessoas: seis metros de profundidade
Peter Larson, de Salt Lake City (EUA), em seu bunker
para 12 pessoas: seis metros de profundidade
Colaborou
Débora Rubin
Acredito que só Deus sabe o dia do fim do mundo, nós pouco sabemos...
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