segunda-feira, 9 de setembro de 2013

A democratização da Síria como método para impor uma ditadura sangrenta

A democratização da Síria como método para impor uma ditadura sangrenta

EPA
Em caso de derrube de Bashar Assad, a Síria irá viver décadas de anarquia e de caos. Os peritos falam de uma fatídica ilusão que vivem os EUA, convencidos que a sua experiência na construção de estados tem uma aplicação universal.
Os norte-americanos se preparam para realizar ataques maciços com mísseis contra alvos na Síria pertencentes ao regime de Bahar Assad. Entretanto, eles concordam que a operação não irá influenciar a atual situação militar na Síria e que a guerra travada pelos sírios poderá durar por mais uns dois anos.
É pouco provável, porém, que a Síria consiga regressar à situação que vivia antes da guerra. Mesmo que Assad conserve as suas posições, o país irá mergulhar no caos e na anarquia. Os Tomahawks estadunidenses irão queimar o panorama sociopolítico da Síria e esse incêndio irá acabar com toda a região. Este é o comentário do perito do Instituto do Oriente Médio Serguei Sereguichev.
"Quanto ao panorama, ele parece o de uma povoação semidestruída. Nós temos neste momento um Egito à beira da guerra civil. A Síria está praticamente destruída. Ambas as partes lutam por ruínas. Os americanos são reféns da sua ideologia baseada no princípio da universalidade do valor da democracia. Os norte-americanos pensam que a sua experiência democrática não é particular e que ela pode ser difundida com sucesso por todas as regiões do mundo, incluindo o Oriente Médio. Se os americanos continuarem a agir como têm feito até agora, nós teremos em vez de um Oriente Médio uma zona de guerra contínua. Também teremos um buraco negro no orçamento da ONU: os refugiados e o terrorismo são apenas a ponta do iceberg."
Em resumo, na opinião dos peritos, a tentativa de impor a democracia, nas atuais condições reais no mundo islâmico, tal elas como se apresentam, irá abrir os caminho do poder a "Hitleres muçulmanos". Isto é o que diz o diretor do Centro de Estudos do Oriente Médio Moderno Gumer Isaev.
"Estamos perante uma reconfiguração do Oriente Médio e as mudanças são inevitáveis. Mas uma intervenção externa origina muitos problemas adicionais. O panorama está realmente se alterando. Eu não falaria de "novos Hitleres". Provavelmente, o maior perigo virá do caos e da instabilidade criados pela alteração de paradigma, porque os regimes que estão no poder há décadas já não conseguem responder aos desafios modernos. Esses regimes têm de ser reformulados e não derrubados porque em condições de caos não se conseguirá obter nada de positivo. Nós não vemos novos líderes, nós não vemos as forças que poderiam tomar o poder com confiança e se tornarem na garantia de uma nova estabilidade."
O conhecido político alemão Joschka Fischer, que foi ministro das Relações Exteriores e vice-chanceler da Alemanha de 1998 a 2005, chegou a referir que o regime de Assad não seria substituído por uma democracia com primazia do direito. Pelo contrário, a nova era será ainda mais desordenada e cruel. Diz Serguei Sereguichev:
"Não interessa se o regime é novo ou velho, o Oriente Médio entrou por muito tempo na zona de transformação. O mais provável será, se não houver uma mudança radical da cultura e da mentalidade da maioria da sua população, daqui a 20 ou 30 anos vermos por lá novas famílias no poder, que irão transmitir o poder por herança de pais para filhos e de tios para sobrinhos, com democracias de fachada, com ruas limpas, mas com horrores nas masmorras dos serviços de segurança locais. E toda a gente ficará satisfeita porque isso é melhor do que uma situação em que todos os dias não sabes se chegarás ou não a casa. A democracia por lá só será possível no caso de as pessoas o quererem."
A comunidade internacional acabou por não receber uma resposta legível à questão sobre o resultado que Obama quer obter com a sua intervenção na Síria. Fica a sensação que ele apenas quer conservar a face, apesar de o bom senso sugerir que a forma mais fiável de reforçar a reputação de um "presidente que acaba com as guerras" seria uma recusa firme em começar uma nova.


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