Os
Fantasmas do Tsunami Japonês
Yuko
Sugimoto: em busca de seu filho Raito, em Ishinomaki. Foto: AFP
JAPÃO. Pouco mais de um ano depois que o
tsunami no Japão (2011) ceifou a vida de moradores de bairros inteiros, rumores
sobre atividade de fantasmas circulam nas cidades, que procuram superar a
tragédia.
Na cidade de
Ishinomaki, por exemplo um projeto de reconstrução não vai adiante por temor
aos espíritos de pessoas que morreram em março passado (2011). Muitos
acreditam, que os fantasmas não apaziguados são portadores de má sorte - ou,
energias negativas.
Uma
residente, Satoshi Abe, 64 anos, comenta, apontando para a obra de um
supermercado paralisada: Ouvi dizer que pessoas que trabalhavam ali
ficaram doentes por causa dos fantasmas. Pessoas morreram em toda parte. A
cidade está cheia de histórias assim.
Ishinomaki é
uma cidade onde predomina a atividade pesqueira. Apesar dos sinais de
recuperação serem visíveis, como casas sendo reconstruídas, empresas reabrindo
suas portas, crianças de volta às escolas, o cotidiano está longe de ser
considerado normal.
Somente
nesta pequena cidade do nordeste do Japão, 19 mil pessoas morreram subitamente.
Outro morador, Shinichi Sazaki - acredita que a memória da tragédia de 11 de
março de 2011 jamais será apagada e as lembranças persistentes criam [e
alimentam] os fantasmas. Ele diz:
Aquele
dia continua voltando à mente. Se você conhece alguém que morreu daquela morte
tão repentina, você pode sentir que a pessoa ainda está lá. eu não acredito em
fantasmas mas entendo porquê a cidade está cheia de rumores.
Um motorista
de taxi revela que teme parar em certos locais da cidade que foram aniquilados
pelas ondas. Ele acha que o cliente pode, eventualmente, ser um espírito.
Alguns afirmam que ouviram histórias de pessoas/espectros que são vistas (os)
correndo para as colinas, como aconteceu naquele dia, buscando abrigo para
escapar das ondas, em uma interminável repetição de seus últimos momentos de
vida.
Especialistas
acadêmicos dizem que a creça generalizada nestes fantasmas é um fenômeno normal
depois de uma tragédia de tais proporções e que isso faz parte do processo de
"cura". Esta é a opinião, por exemplo, do antropólogo cultural Takeo
Funabiki:
É
natural que as histórias do sobrenatural proliferem após um evento como este. É
muito difícil para os seres humanos aceitar a morte, ainda mais para aqueles
que possuem uma mente superticiosa. A morte repentina, não esperada, anormal,
qualquer coisa diferente da morte por velhice, é particularmente difícil paraa
compreenção de muitas pessoas.
Para muitos
dos que perderam entes queridos na tragédia, o recurso às tradições e rituais é
proveitoso e mesmo necessário. Sacerdotes xintoístas têm sido requisitados para
apaziguar as almas e facilitar a aceitação da morte e passagem para o
"outro mundo". Nos lugares onde corpos foram encontrados, são
realizados rituais de purificação.
No festival
budista de Obon, que acontece no verão, oferendas foram deixadas em altares
como presentes para para os espíritos que, segundo a crença, nessa ocasião,
retornam ao mundo por alguns dias para rever pessoas e lugares aos quais são
afeiçoados.
Terapeuta e
membro da Academia de Conselheiros do Japão, Koji Ikeda explica: Os
sobreviventes experimentam emoções complexas. Medo, ansiedade, tristeza e
desejo de retorno das pessoas falecidas. Nem todos conseguem lidar com essa
complexidade de sentimentos - o que pode levar às "projeções de
espíritos". É uma forma de superação, de adaptação à nova realidade para
que se possa, aos poucos, seguir em frente apesar da dor.
FONTE: Tsunami recedes but ghosts linger
SYDNEY MORNING HERALD/Austrália-AFP, publicado em 10/03/2012
[ http://www.smh.com.au/world/tsunami-recedes-but-ghosts-linger-20120309-1upqk.html#ixzz1olve6sXr]
SYDNEY MORNING HERALD/Austrália-AFP, publicado em 10/03/2012
[ http://www.smh.com.au/world/tsunami-recedes-but-ghosts-linger-20120309-1upqk.html#ixzz1olve6sXr]
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